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quarta-feira, 19 de maio de 2010

Em defesa de Alice

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A primeira coisa (na verdade deve ser a terceira ou a quarta) que noto quando Alice passa pela portinha para o jardim foi um moscavalo zunindo no meio da tela. Devo dizer que era um lindo moscavalo. Exatamente como eu tinha imaginado. Bem que com as ilustrações de John Tenniel, não me sobrou muita margem pra imaginar. É real, perfeito, indiscutivelmente o que está no papel. O que não deixa a Alice de Luiz Zerbini (Cosac Naif) nem um pouco menos encantadora.

Alice in Wonderland (ou underland, como preferirem) de Tim Burton é também encantador. Em cada detalhe do figurino, dos cenários ou das falas, a Alice de Carrol (e aquilo que ela se tornou) está mais que presente. Não há dúvidas de que não é a mesma personagem do livro 1965, da mesma forma que a menina do livro não é a mesma Alice Liddell da realidade, tampouco as das tantas versões pra cinema e TV que foram produzidas. Assim como a Alice que eu li não é mesma que as outras pessoas leram por mais que na mesma versão do livro.

Não precisa ser um gênio da semiótica pra dizer o que eu estou dizendo. Mas aqui chegamos num ponto importante ao se falar da Alice de Burton. Por que, raios, quase todas as críticas do filme que eu li e ouvi até agora reclamam da adaptação? Quantas vezes será preciso dizer, nesse mundo, que versão de livro pra cinema nunca vai sair igual ao livro? Por motivos simples, entre eles: é bem difícil um livro caber dentro de um filme. |Sempre faltará algum detalhe que, você leitor chato, vai reclamar pra poder mostrar para os outros que leu o livro, e por isso é um intelectual/inteligente/nerd| Fora todas as coisas que eu falei antes...

Se não dá pra esperar isso de obras que foram feitas para se parecem com os livros (como Harry Potter e coisas do gênero), o que dirá de uma versão feita em 2010, de um livro escrito em 1864, por um diretor que tem uma linguagem estética das mais fortes da história do cinema. |Um filme do Tim Burton é um filme do Tim Burton. ponto|

Especificamente sobre essa versão de Alice, ouvi muitos comentários sobre se misturar os dois contos (Aventuras no País das Maravilhas e Através do espelho). | Como se na versão clássica da Disney, e em várias outras por aí, isso já não tivesse acontecido. Bla bla bla| Em minha opinião, considerar isso como fator principal é sub-valorizar a obra. Burton mistura, sim, os dois contos e cria em cima disso. Quem conhece a história sabe que a Rainha Branca, distinta senhora que tem memória para o futuro, representa uma peça do xadrez, tal qual a maioria dos personagens do “Através do Espelho e o que Alice encontrou por lá”. Nesse mesmo conto temos também a Rainha Vermelha, a louca e apressada opositora da Rainha Branca. Que é, da mesma forma, uma peça de xadrez |Diferente do que estamos acostumados, a oposição se dá entre vermelho e branco, e não preto e branco.| Já a Rainha de Copas, que possui um exército de Baralho, gosta de cortar cabeças e usar Flamingos como tacos, pertence ao outro conto, “Aventuras de Alice no País das Maravilhas”. Posso estar enganada, mas não me lembro de nenhuma referência desses personagens terem se cruzado, muito menos do fato da Rainha Branca e da Rainha de Copas (chamada de Rainha Vermelha no filme) serem irmãs.

Mas, como ninguém aqui se importa com isso, vamos ao que interessa. Burton criou em cima da história original, reinventou o enredo e os personagens tecendo uma nova história. E, a contrariando a encheção de saco, muito dignamente jogou a sua “nova história” no “futuro” da original não alterando em praticamente nada o que viveu a Alice de Carrol. Burton, sim, da uma cara mais humana à personagem, quando transforma o seu delírio de infância em algo um tanto quanto perturbador, através dos sonhos repetidos. |Confesso que aquela criança que ia parar sozinha em mundo desconhecido, povoado de criaturas loucas e ameaçadoras (Cortem a cabeça! ou Você é uma criança muito estúpida!) sem demonstrar quase nada de medo, me perturbava desde a primeira vez que tive contato com a historia. Provavelmente com a mesma idade que Alice|. E preenche a deixa de Carrol no final de um dos contos |não me lembro qual|, quando faz, através da Irmã, suposições sobre a Alice futura. Se manteria sua personalidade sonhadora, etc...

Burton desenha essa nova Alice e nova Wonderland, deixando-as completamente “Burton”. Respeita o conto de Carrol sem deixar de lado a sua linguagem tão afamada. Como eu já disse, o filme é encantador. É uma aula de referência visual. O Castelo de Copas é fantástico. Os figurinos de Alice (sim, ela troca várias vezes) são muito bons. Johny Depp, está ótimo |maisdomesmo|. E o moscavalo... eu queria um pra mim.

Quanto ao roteiro... não tenho absolutamente nada a dizer contra. Eu gostei, acho que fechou com a proposta |ao menos a proposta que eu supus|. Mas não vou falar mais disso por hora, se não acaba entregando muito do filme.

Por que eu escrevi isso?

Essa não é uma crítica ao filme. Até por que eu não entendo de cinema, nem de Alice. Essa é uma crítica às críticas. Escrevi por que eu não agüento mais as pessoas reclamando do filme. E, principalmente, ver alguém desistindo de assistir por causa das críticas. Críticas, em sua maioria, fundamentadas por algum delírio que a pessoa teve de como seria o filme de seus sonhos. As pessoas não esperam filmes, esperam milagres. E aí justificam que o filme não era “tudo que foi anunciado”. Parafraseando Suzana Back (minha ex-professora de metodologia), eles são responsáveis pelo que eles dizem não pelo que vocês entendem.

Mas, como diria Maria Antonieta, pra alguém que gostou do Avatar... |ta reclamando, vai assistir “As branquelas”, porr*|... mas isso é outra história.

P.S.: Não me responsabilizo se você assistir e não gostar. Lembre-se, é só um filme. :P

|Não acredito q fiquei até as 3:00h fazendo isso. :O |

Um comentário:

Unknown disse...

As pessoas criticam porque são como cavalos com suas viseiras. Não enxergam nada além de seus umbigos. Não percebem que Burton retrata uma mesma história, porém com uma "visão adulta". A Alice cresceu, amadureceu, mas continua a mesma pessoa sonhadora. As pessoas crescem, não amadurecem e continuam sem percepção.
Beijo!